Depois, recordo perfeitamente coisas que nunca aconteceram. O coma tem destas coisas. A, já falada, guerra da Índia, o meu melhor amigo, com tuberculose, isolado, num quarto ao lado do meu, o meu antigo sogro a jogar à bola contra um portão debaixo de a janela do meu quarto. Nada disto aconteceu, mas a tudo recordo na perfeição. É incrível o que a nossa mente é capaz de fazer. Uma das coisas que recordo bem e que nunca aconteceu, como vos será óbvio quando eu a contar, é a visita do Kurt Cobain – antigo (e – há já uns anos – morto) vocalista dos Nirvana. Era ele, mas, tipo sonho, falava português. Deu-me cigarros (na altura, a da sulipampa, eu fumava bastante; agora nem o cheiro, mas, na altura, fumava bastante e aqueles cigarros, como se costuma dizer, souberam-me a pato) e, claro, transmitiu-me força. Claro que isto nunca aconteceu, mas foi agradável na mesma.